Profa. Dra. Kátia Barbosa Macêdo e Sigmar Malvezzi
RESUMOO presente texto tem como objetivo analisar as funções dos gestores a partir de duas propostas epistemológicas: primeiramente a proposta da Administração Científica que visa a adaptação e controle disciplinar do trabalhador, e em seguida, a proposta da Psicodinâmica do Trabalho, que visa a superação da alienação e a emancipação do trabalhador. Após contextualizar os paradigmas nas ciências sociais, o texto apresenta as duas abordagens a partir das quaissão discutidas as funções dos gestores e seus efeitos nos trabalhadores, a adaptação e a submissão no primeiro modelo e a emancipação no segundo. Palavras–chave: gestão; paradigma, emancipação; adaptação.
RESUMO
O presente texto tem como objetivo analisar as funções dos gestores a partir de duas propostas epistemológicas: primeiramente a proposta da Administração Científica que visa a adaptação e controle disciplinar do trabalhador, e em seguida, a proposta da Psicodinâmica do Trabalho, que visa a superação da alienação e a emancipação do trabalhador. Após contextualizar os paradigmas nas ciências sociais, o texto apresenta as duas abordagens a partir das quaissão discutidas as funções dos gestores e seus efeitos nos trabalhadores, a adaptação e a submissão no primeiro modelo e a emancipação no segundo.
Palavras-chave: gestão; paradigma, emancipação; adaptação.
1 INTRODUÇÃO
A gestão do trabalho é uma atividade própria do ser humano,desde os momentos mais primitivos da vida comunitária. Reconhecer a necessidade da complementaridade de competências para se realizar objetivos acima dos limites de indivíduos singulares é próprio do ser biológico, como se pode observar, até entre animais, como as abelhas, aves e lobos. A construção do ninho pelo casal de “João de barro” revela a cooperação paraa sobrevivência. A complementaridade de competências implica na distribuiçãodiferencial de tarefas entre os distintos indivíduos de um grupo. Essa é a lógica que viabilizou e desenvolve o trabalho coletivo.
Na sociedade humana, sempre em evolução, a gestão do trabalho coletivo revela a busca da eficiência, através da articulação intencional dos meios necessários às transformações na natureza desejadas por algum grupo. As realizações requerem instrumentalidade e ação coletiva que se viabiliza através da divisão de tarefas. Esta articula a complementaridade de competências nas ações conjuntas. A articulação de tarefas e sua distribuição ocorrem através das escolhas dentre diversas possibilidades próprias do ser humano em sua condição de agente indeterminado. Essa articulação se alicerça nas propriedades dos objetos e das atividades visando as transformações específicas que os objetivos das pessoas e da sociedade definiram para a construção de suas existências no mundo. A articulação da instrumentalidade do trabalho é uma potencialidade, aberta para se ajustar à diferentes critérios, como a história do trabalho revela, na cooperação comunitária intuitiva, na escravidão, no artesanato e no emprego. Analisar a divisão de tarefas assumida como base da articulação das atividades distribuídas entre diversos indivíduos é o escopo deste ensaio. Seu objetivo é contribuir com a compreensão dessa atividadeneste momento no qual o trabalho é re-institucionalizado da arquitetura dos empregos para o formato atualmente denominado de trabalho precário autônomo.
Seu alvo específico é analisar a influência de dois paradigmas que alicerçaram, de modo diverso, a racionalidade das escolhas na articulação da divisão de tarefas. Construído na racionalidade positivista, o primeiro paradigma analisado é centrado nos resultados econômicos do trabalho e o segundo, construído dentro do reconhecimento da subjetividade, é centrado na interface entre a transformação funcional e a qualidade da existência humana. A divisão das tarefas é viabilizada a partir da compreensão e escolha alguma dessas racionalidades.
2 O MODELO ORGANIZACIONAL TEM COMO BASE OS PARADIGMAS
Desde Descartes, no século XVII, a busca do conhecimento foi formalmente associada aos métodos para a sua produção. Nem os gregos, nem os filósofos que os sucederam, como Agostinho de Hipona e Tomas de Aquino deram significativa atenção ao método. Descartes, diferentemente, enriqueceu a reflexão filosófica trabalhando na configuração da metodologia que diferenciava a certeza científica de outras formas de conhecimento. De sua reflexão, surgiu nova racionalidade para a produção do conhecimento científico, amplamente disseminada em todos os campos do saber (Cunha, 2017) com impactos significativos nas atividades humanas. O trabalho de Descartes tornou-seum marco para a Filosofia e para o estudo da divisão detarefas. A visão cartesiana fomentou a consciência do método como instrumento diferenciador da validade da ciência em confronto com outros tipos de conhecimento.
O modelo de racionalidade que preside a ciência moderna constitui-se a partir da revolução científica do século XVI e foi desenvolvido nos séculos seguintes basicamente no domínio das ciências naturais. Sendo um modelo global, a nova racionalidade científica é também um modelototalitário e hegemônico. Segundo esse modelo, conhecer significa dividir e classificar para depois poder determinar relações sistemáticas entre o que se separou. O resultado é um conhecimento baseado na formulação de leis que se apoiam no pressuposto metateórico da ideia de ordem e de estabilidade do universo, a ideia de que o passado se repete no futuro. Esta ideia do mundo-máquina foi tão poderosa que se transformou na hipótese universal da época moderna: o mecanicismo. (Santos, 1987, p. 10-18).
Esse novo rumo, originado com Descartes, ainda impacta na pesquisa científica, nos campos das ciências naturais e das ciências sociais. O alinhamento da pesquisa à racionalidade cartesiana evidenciou que sua aplicabilidade nas ciências sociais se mostrou problemática, uma vez que os fenômenos humanos são dinâmicos,sensíveis à influência do contexto sócio-político-econômico e ainda enfrentam dificuldades de observação e regulagem de realidades subjetivas e relacionais. Desse modo, as ciências sociais aprenderam a reivindicar um estatuto metodológico próprio, a partir do qual emergiram paradigmas que evidenciaram diferenças entre as ciências exatas e humanas em suas capacidades de apreensão de seus fenômenos. Essa alteração na compreensão do conhecimento proposta por Descartes aparece, de modo claro, no trabalho de Herbert Mead (1962), reconhecido como articulador da chamada epistemologia das ciências sociais. Nessa diferenciação, sobre critérios do conhecimento científico, desponta o debate que acompanha o pensamento filosófico, desde os gregos nos campos da Ontologia e Epistemologia.
Esse debate foi sistematizado na articulação de quatro bases que Burrel e Morgan (2008) elaboraram para explicar essa diversidade metodológica na constituição da teoria social: ontologia (a essência do fenômeno); epistemologia (a construção do conhecimento); a visão sobre a condição humana ( determinista ou voluntarista); e a metodologia. Para esses autores, dependendo das escolhas que o pesquisador assume dentre essas bases, seu trabalho caminha na plataforma de algum desses quatro paradigmas: funcionalista; interpretativista; humanista radical, e estruturalista. O estudo da divisão de tarefas expõe a gestão do trabalho frente a essa escolha.
Como explicitado nos objetivos deste texto, seu conteúdo é dedicado à análise de duas abordagens que refletem escolhas distintas, por parte do pesquisador. A primeira delas é a Administração Científica, que predominou na gestão desde o início do século XX, enquadrada no paradigma funcionalista, e a segunda, despontada na literatura, 60 anos depois, é a Psicodinâmica do Trabalho, alinhada ao paradigma do humanismo radical. A Administração Científica parte do pressuposto da sociedade apoiada na divisão social do trabalho e na prioridade dada à produção econômica. Nessa racionalidade, a adaptação do trabalhador à organização é enfatizada, enquanto sua subjetividade é legada a um plano secundário. Já, na Psicodinâmica do trabalho, a adaptação do trabalhador requer participação ativa, com sua subjetividade, conforme a proposta do paradigma do Humanismo Radical. Essas duasvisões contribuíram para a compreensão do trabalho e do trabalhador direcionando de modo distinto a pesquisa e gestão da divisão de tarefas. Ambas reconhecem as tarefas, sua divisão e distribuição, como instrumentos da organização do trabalho e da adaptação, porém dentro de equações diferentes quanto à participação do trabalhador.
As ferramentas de trabalho são recursos inventados e aperfeiçoados para aperfeiçoar, facilitar e ampliar as habilidades humanas na realização deatividades que produzem transformações requeridas pela consecução de algum fim específico. Para cumprir sua finalidade, as atividades são consideradas a partir das operações que as constituem as quais podem ser realizadas por pessoas ou por instrumentos. As operações atribuídas às pessoassão denominadas por tarefas. A estruturação das tarefas é fator crítico na gestão do trabalho, na adaptação e nos resultados.Essa atividade impacta em todos os aspectos do processo de produção e na qualidade de vida do trabalhador, uma vez que define, aomesmo tempo, as condições de trabalho, as relações de poder, a eficácia daspolíticas de gestão, as relações sócio profissionais, a inserção do trabalhador na sociedade, entre dezenas de outras consequências, já amplamente conhecidas . Essa estruturação reflete a compreensão da sociedade e das relações de trabalho, bem como as escolhas que decorremdo modelo de gestão do trabalho que pode, ou não atender as necessidades dos contextos históricos, sempre marcados por estágios de mudanças econômicas, sociais, políticas e tecnológicas. “As organizações são produto de determinada realidade socioeconômica à medida que reproduzem os princípios vigentes e também influenciam o ambiente, num movimento de mútua transformação” (Heloani, 2003, p. 15).
O surgimento de modelos de gestão do trabalho sempre está atrelado à racionalidade de algum paradigma em resposta às demandas de contextos socioeconômicos específicos, que passam pelo escrutínio de estudos teóricos e empíricos para sua compreensão e validação. Este texto ilustra esses estudos ao analisar os modelos de gestão da Administração Científica, desenvolvida no início do século XX, e da Psicodinâmica do Trabalho, desenvolvida por Christophe Dejours, nos anos 1980. O modelo de gestão de qualquer organização revela a racionalidade sobre a qual a divisão de tarefas é planejada e desenvolvida em consistência com as normas disciplinares, valores, rituais e cultura organizacional. Planejamento e divisão de tarefas são atividades nas quais o processo da socialização organizacional é desenvolvido.
A socialização organizacional é um instrumento crucial do processo de adaptação através do qual os trabalhadores aprendem a importância, o objetivo e os meios de adaptação às suas tarefas , à organização e ao ambiente Esse aprendizado é induzido pela transmissão de conteúdos que explicam os objetivos fundamentais da organização, os meios para a sua realização, as responsabilidades de seus membros, os padrões de comportamento necessários para o desempenho eficaz e o conjunto de regras e princípios implicados na sustentabilidade da organização, conservação de sua identidade e integridade. O processo de socialização organizacional sustenta a adaptação dos trabalhadores às suas normas, rituais e valores, à sua cultura, capacitando-os para desempenhar as tarefas de modo congruente entre si.
Nessa capacitação, a cultura da organização atua no imaginário coletivo para torna-lo consistente com seu sistema de símbolos, que fornece um sentido prévio a cada ação dos indivíduos, conforme Macêdo (2002) e Pires e Macêdo (2006). Essa consistência se dá pelo processo de socialização organizacional, que tem como função direcionar e alocar os trabalhadores em sua rede de interações. Se o indivíduo se identifica com a organização, se só pensa através dela, se a idealiza a ponto de sacrificar sua vida privada às metas que ela persegue, sejam quais forem, ele entrará, mesmo sem o saber, num sistema balizador e legitimador de sua existência. Para Foucault, o resultado disso é denominado de disciplina, entendida por ele como
Uma técnica, um dispositivo, um mecanismo, um instrumento de poder, são métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que asseguram a sujeição constante de suas forças e lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade… é o diagrama de um poder que não atua do exterior, mas trabalha o corpo dos homens, manipula seus elementos, produz seu comportamento, enfim, fabrica o tipo de homem necessário ao funcionamento e manutenção da sociedade industrial, capitalista. (Foucault, 1975, p. 139)
Os pressupostos da teoria da Administração Científica e da Psicodinâmica do Trabalho se diferenciam assumindo visões antagônicas sobre as funções dos gestores e sobre a divisão do trabalho na racionalidade da divisão de tarefas, e, portanto, na socialização como exposto no Quadro 2.
Nesse quadro, as diferenças entre os dois paradigmas podem ser facilmente capturadas. O paradigma da Psicodinâmica do Trabalho expõe uma abordagem singular que reconhece a subjetividade do trabalhador e seu papel na adaptação e na fluência e qualidade do processo de produção. Hoje, na reinstitucionalização do trabalho, promovida pela digitalização, privilegiar a criatividade e a inovação revela reconhecimento de condições de trabalho e de articulação de tarefas que necessitam do protagonismo cognitivo do trabalhador.
3 A ADMINISTRAÇÃO CIENTÍFICA: ADAPTAÇÃO E CONTROLE
A Administração Científica, criada e implementada pelosmodelos do taylorismo, fayolismo e fordismo surgiu como resposta às necessidades da redefinição do trabalho e divisão de tarefas, seguindo demandas da emergente tecnologia eletromecânica. Novos critérios para a divisão do trabalho eram necessários para que os desempenhos pudessem atender ao ritmo veloz de produção imposto por instrumentos mecanizados de trabalho.
Taylor estudou a divisão de tarefas, realizando experimentos na oficina de construção de máquinas da Midvale Steel Company, desde 1884. Nesses experimentos, ele partiu do pressuposto de que o conhecimento científico poderia ser aplicado à gestão das organizações, com alta probabilidade de aumentar a produção. Ele sonhava com um gestor capaz de aplicar o conhecimento científico munido de técnicas para descobrir a melhor maneira de maximizar a eficiência. Para tanto, ele propôs cinco princípios básicos para a gestão das tarefas: transferir toda a responsabilidade da organização do trabalho do trabalhador para seu supervisor; pesquisar a forma mais eficaz de dividir e realizar tarefas através de métodos científicos para determinar; selecionar a melhor pessoa para desempenhar as tarefas dos cargos; treinar o trabalhador para desempenhar eficientemente todo o trabalho; e fiscalizar o desempenho do trabalhador para assegurar que os procedimentos apropriados de trabalho sejam seguidos e que os resultados sejam atingidos, segundo Morgan (1996).
Naquela época, a força bruta predominava nas relações de trabalho e, ao trabalhador operacional, cabia apenas obedecer às ordens dos gestores. Essa proposta, assumida como Administração Científica apresentava nova visão de gestão, que segundo Taylor.
O principal objetivo da administração deve ser o de assegurar o máximo de prosperidade ao patrão e, ao mesmo tempo, o máximo de prosperidade ao empregado. Igualmente, máxima prosperidade para o empregado significa, além de salários mais altos do queos recebidos habitualmente pelos obreiros de sua classe, este fato de maior importância ainda, que é o aproveitamento dos homens de modo mais eficiente, habilitando-os a desempenhar os tipos de trabalho mais elevados para os quais tenham aptidões naturaise atribuindo-lhes, sempre que possível, esses gêneros de trabalho. (Taylor, 1985, p.29)
Taylor estendeu igualmente esses critérios para o trabalho intelectual (exercido pelos gestores) aplicando a todos a norma da divisão de tarefas por especialização, demodo a decompor o trabalho em atividades individuais mínimas, separando a inspeção da produção. Essa norma implicava que cada trabalhador desempenhasse repetitivamente apenas uma operação, instituindo a utilização intensiva de mão de obra não especializada, mesmo em um processo de produção que era muito especializado, conforme Heloani (2003).
Dessa proposta de Taylor infere-se sua concepção do trabalhador como homo economicus, regulado pela gestão racional, que toma decisões sempre pautada em metas econômicas, apoiada no cronometro e na prancheta para controlar os movimentos dos operários, como procedimento para o maior rendimento sem comprometer em demasia a saúde do trabalhador. Todas essas tarefas minuciosamente descritas e cronometradas eram definidas pelo setor de planejamento de organização de tarefas, que também se encarregava de selecionar e treinar os trabalhadores para os postos de trabalho, considerando suas aptidões pessoais. Nas próprias palavras de Taylor
Na tarefa é especificado o que deve ser feito e também como fazê-lo, além do tempo exato concebido para a execução. Quando o trabalhador consegue realizar a tarefa determinada, dentro do tempo limite especificado, recebe um aumento de 30 a 100% do seu salário habitual. Estas tarefas são cuidadosamente planejadas de modo que sua execução seja boa e correta, mas que não obrigue o trabalhador a esforço algum que prejudique a saúde. A administração científica consiste em preparar e fazer executar essas tarefas. (Taylor, 1985, p. 51)
Ao instituir o planejamento de organização de tarefas, formalmente alocado na estrutura hierárquica, a Administração Científica colocou essa forma de gestão do trabalho no campo da ciência que dividia com a regulagem por parte do supervisor a responsabilidade da execução de cada tarefa. Com isso, esperava-se a transição dos antigos sistemas de administração para uma ação cientificamente organizada. Essa proposta se apoiava nos pressupostos positivistas do racionalismo da época, no qual predominava a ideia de que só existe progresso mediante a ordem e, esta somente é eficaz onde houver a subordinação da prática à teoria, e onde o conflito é tratado como uma distorção a ser corrigida.
Ao propor essa forma de relação entre o capital e o trabalho, a Administração Científica estabelecia critérios para a relação formal de trocas entre dois sujeitos que são histórica e politicamente desiguais: segundo seus defensores, tanto a organização quanto os trabalhadores seriam beneficiados porque essa racionalidade seria o único caminho para se obter a maximização da produção, da qual resultaria, por corolário, a maximização dos lucros e dos salários, uma vez que o salário do trabalhador era calculado por sua produção. Considerando que mesmo essa racionalidade não poderia controlar todas as variáveis, a Administração Científica completa sua proposta com a ênfase na hierarquia, na disciplina e no controle, exercido pelos gestores.
Na prática, havia problemas, tal como hoje, porém, quando ocorriam dificuldades nos desempenhos, o trabalhador era separado do grupo e encaminhado para treinamento individual. Taylor comenta as vantagens dessa tática que visava evitar grupos, multidões que poderiam significar um contra poder. “Deixando de lidar com homens, e considerar cada trabalhador individualmente, entregamos o trabalhador que falha em sua tarefa a instrutor competente para lhe indicar o melhor modo de executar o serviço e para guia-lo, ajudá-lo e encorajá-lo a estudar suas possibilidades”. (Taylor, 1985, p. 73).
As relações entre trabalhadores e supervisores seriam cooperativas, sob a subordinação do trabalhador ao imperativo do conhecimento científico. Mesmo nessa racionalidade, a eficiência requeria aperfeiçoamento de pessoal e adoção de mecanismos disciplinares, visando cumprimento do ritmode trabalho do operário, que era selecionado de acordo com suas habilidades. Segundo Taylor:
Em uma palavra, o máximo de prosperidade somente pode existir como resultado do máximo de produção. Se for exato o raciocínio acima, conclui-se que o objetivo mais importante de ambos, trabalhador e administração, deve ser a formação e o aperfeiçoamento do pessoal da empresa, de modo que os homens possam executar em ritmo mais rápido e com maior eficiência os tipos mais elevados de trabalho, de acordo com suas aptidões naturais. (Taylor, 1986, p. 31)
Taylor percebeu que o trabalhador comum também deveria ser estimulado a pensar, e oferecer ideias que pudessem ser aproveitadas para beneficiar a organização e aumentar a produção, porém sem prejudicar a organização do trabalho e a hierarquia. Ele previa que o trabalhador deveria receber reconhecimento, prêmios e recompensas pelas melhorias que propusesse e fosse eficazmente implantada na produção.
A adesão do trabalhador operacional a esse modelo de administração, demandou novas técnicas que foram desenvolvidas pelos setores de métodos e sistemas que desenhavam as tarefas. As mais impactantes entre essas técnicas,foram procedimentos de descrição e de análise dos cargos que foram integradas ao sistema de controle e registro de tempos e movimentos. Essas técnicas abrangeram diversos setores da gestão de pessoal. Tendo como ponta de processo de produção, a descrição minuciosa das operaçõesa serem desempenhadas, normas e padrões de qualidade que deveriam ser rigorosamente seguidos; a gestão de pessoal era complementada pela seleção e treinamento dos trabalhadores; a distribuição equitativa do trabalho entre indivíduos, clareza na responsabilidade do operário e na autoridade da direção. O processo de produção era complementado por procedimentos de avaliação de desempenho caracterizado pela aferição individual. Nesse processo, a produção era privilegiada e a subjetividade do trabalhador era totalmente desconsiderada. A implementação desse paradigma favoreceu a valorização dos mecanismos disciplinares que foram crescentemente integrados às práticas de gestão. Nas condições da época, esse instrumental deu conta das demandas de produtividade (Guimarães Júnior e Macêdo, 2013) esperadas pelo modelo econômico predominante.
Apesar dos questionamentos e críticas relacionadas às condições e exploração do trabalho Maia (2010), esse paradigma foi amplamente difundido e assumido como fórmula eficaz de organização das tarefas e de relações de trabalho, capaz de se ajustar a novas condições e problemas das quais resultaram sua versão na Teoria das Relações Humanas e no Behaviorismo. Seu sucesso econômico aprofundou a crença em sua eficácia para o crescimento de produção industrializada e do comércio. Contudo, a constatação da eficácia da produção em contraste com a rotina de trabalho ao custo de longas jornadas, tarefas pesadas e insatisfações generalizadas fomentou o reconhecimento da exploração da mão de obra por parte dos interesses econômicos. A crescente visibilidade dos problemas sociais e pessoais impactou na confiança que esse modelo recebera.
O taylorismo elaborou a primeira tentativa de administrar a percepção dos trabalhadores. O insight taylorista pressupunha a cooperação recíproca entre capital e trabalho, continha um projeto de manipular a subjetividade do trabalhador, denominado reprocessamento da percepção do espaço produtivo(Heloani (2003). Esse processo foi aprimorado, desde sua versão exitosa da linha de montagem fordista, assim como contaminou a racionalidade criada pelo modelo de sistemas, que acomodou muitas práticas da Administração Científica.
Cresceram as pressões para a revisão desse modelo. Os problemas sociais e a insatisfação individual demandavam alguma ação de natureza teórica e prática. Essa ação despontou em reações crescentes manifestadas no desenvolvimento de teorias que tratavam do trabalhador, mais do que de seu desempenho (Maslow, 1954; MacGregor, 1960; Argyris 1957) e da organização dos trabalhadores para solicitar mudanças e melhores condições de trabalho. Embora esse modelo continuasse a influenciar a formação e o imaginário dos gestores (Atehortúa Hurtado,2013; Trindade, Mello e Silva, 2016) a revisão do paradigma da Administração Científica pode ser constada no surgimento doa paradigma da Psicodinâmica do Trabalho já no horizonte da gestão do trabalho desde os anos 1970.
4 A PROPOSTA EMANCIPATÓRIA DA PSICODINÂMICA DO TRABALHO
Em decorrência do amplo uso dos princípios da Administração Cientifica, que se ajustaram à evolução da tecnologia, desde o momento do final da segunda grande guerra, a sociedade aprendeu a reconhecer e dar relevância às doenças relacionadas ao trabalho e ao seu visível aumento. Dados da Organização Mundial de Saúde e da Organização Internacional do Trabalho revelam o aumento de acidentes, mortes e enfermidades decorrentes do trabalho (Macêdo, 2015). Esses fatos alertaram os pesquisadores para a revisão dos critérios e formas de divisão das tarefas como objeto privilegiado para a compreensão da adaptação ao trabalho. Inúmeros estudos, principalmente, pesquisas em projetos de doutorados e mestrados foram elaborados na área da saúde mostrando a necessidade da revisão de pressupostos que fundamentavam a gestão do trabalho. Um dos projetos pioneiros aconteceu na Inglaterra sob a orientação dos pesquisadores do Tavistock Instituteof Human Relationse logo em seguida despontou a pesquisa que afunilou na Psicodinâmica do Trabalho, foco deste texto.
A Psicodinâmica do Trabalho surgiu como reação à Administração Científica ao colocar a qualidade de vida do trabalhador como critério para a divisão de tarefas e das condições de trabalho. Dessa reação, surgiu um novo paradigma, no qual a subjetividade, participação e cooperação do trabalhador foram seus pontos chaves. Essa abordagem surgiu da atenção dos pesquisadores à prevenção dos adoecimentos e à promoção da saúde do trabalhador buscando dados sobre os impactos na subjetividade em sua saúde e assumindo o trabalhador em sua existência como um todo. Essa alteração de rumos ofereceu subsídios para a crítica aos modelos de gestão criados a partir da evolução da Administração Científica e de sua difícil sustentabilidade diante da crescente complexidade do ambiente de trabalho. Em diversas situações, os pressupostos da Administração Científica eram detectados como fontes dos problemas, como constatados nos projetos de qualidade de vida no trabalho, desenvolvidos desde os anos 1960. A Psicodinâmica do Trabalho tomou a estrutura subjetiva dos trabalhadores e suas relações sociais como fatores cruciais da organização das tarefas e das condições dos desempenhos, portanto, critérios incontornáveis da saúde física e mental. Esse reconhecimento questionou a limitação à eficiência organizacional como resultado da racionalidade técnica das tarefas e acrescentou a essa análise o engajamento dos trabalhadores em seu trabalho, que desponta de sua mobilização subjetiva.
Essa nova visão chamou a atenção de pesquisadores da gestão de pessoas e da divisão de tarefas, motivando o olhar para a relação do homem com o trabalho. No Brasil, essa visão alimenta projetos, desde a década de 1980. Os conceitos que a sustentam enfocam a pesquisa sobre a gênese do sofrimento mental e sobre o potencial de alterações na organização do trabalho como caminhos para a superação de acidentes e sofrimentos. O sofrimento foi tomado como fonte geradora de constrangimentos e tensões capazes de desestruturar a vida psíquica do sujeito. Como rejeitar essa hipótese antes de ser pesquisada?
Dejours (2004), um dos fundadores dessa visão emergente, pesquisou o trabalho como um determinante da relação social associado a investimentos afetivos, solidariedade e confiança. Seus achados teóricos revelaram que engajamento da subjetividade individual está relacionado com o coletivo de trabalho. Em sua essência, o ato de trabalhar mobiliza tanto o corpo quanto a subjetividade do trabalhador, não podendo sua pesquisa ser limitada apenas aos aspectos visíveis. Essa revisão da relação com o trabalho ganhou força levando-o a ser entendido nas implicações do saber fazer, do engajamento do corpo, da mobilização da inteligência, da capacidade de refletir, de interpretar e de reagir às situações, sendo poder de sentir, de pensar e de inventar.
A pesquisa e a prática desenvolvidas dentro da Psicodinâmica do Trabalho assumiram o trabalho como atividade central para a construção do sujeito na constituição da sua subjetividade, portanto, reconhecendo os impactos da divisão das tarefas na vida psíquica. Nesses impactos despontam a construção da identidade do trabalhador, outro fator crucial na sua relação com o mundo. Por corolário, a responsabilidade do gestor inclui sua atenção ao sofrimento no trabalho tendo em vista que seus danos à saúde mental não são fatalidades, mas resultados do desempenho das tarefas, do ritmo de desempenho e das condições do ambiente. Esta crença comunica que a adaptação entre o trabalhador e suas tarefas não seria justa se focasse apenas no potencial de mudança operacional encontrado no trabalhador, porque há potencial de mudanças nas tarefas que se relacionam com superação do sofrimento do trabalhador. Nessa racionalidade, a Psicodinâmica do Trabalho desenvolve e coloca as mudanças nas tarefas considerando os impactos em seu executante como critério para a organização do trabalho. Destarte, essa abordagem assume duas grandes categorias de análise para orientar a investigação da organização do trabalho: a divisão das tarefas e seus impactos na mobilização subjetiva do trabalhador.
A organização do trabalho, com suas prescrições, define os destinos que o sofrimento do trabalhador terá como reação criativa ou patogênica, dependendo da margem de negociação entre suas imposições e a realidade do trabalho.
A organização do trabalho é, de um lado, a divisão das tarefas, que conduz alguns indivíduos a definir por outros, o trabalho a ser executado, o modo operatório e os ritmos a seguir. Por outro lado, é a divisão dos homens, isto é, o dispositivo de hierarquia, de supervisão, de comando, que define e codifica todas as relações de trabalho. Quando se coloca face a face o funcionamento psíquico e a organização do trabalho, descobre-se que certas organizações são perigosas para o equilíbrio psíquico e que outras não o são. (Dejours, Dessors e Desrieux, 1993, p. 104).
A maneira como essas dimensões são estabelecidas e a rigidez de sua observância em determinado contexto de produção podem definir se o engajamento do trabalho favorecerá a alienação, a construção de defesas patológicas, do sofrimento e do adoecimento, ou se possibilitará a emancipação, o reconhecimento e o fortalecimento da identidade, a construção de defesas, de adaptação e o recurso à criatividade, (Fleury e Macêdo, 2012).
Partindo daquilo que lhe é prescrito como tarefas e dado como ambiente, o trabalhador se vê obrigado a se mobilizar física e psiquicamente para transformar seu desempenho em ação auto produtiva. Essa mobilização subjetiva desponta como a segunda categoria de análise da Psicodinâmica do Trabalho. Conforme Dejours (2016, p. 192). “Não existe inteligência sem a mobilização individual e coletiva das pessoas. A análise clínica sugere que a mobilização no trabalho é anterior à formação da inteligência mesmo quando háo desejo dos trabalhadores”.
Em síntese, o paradigma da Psicodinâmica do Trabalho reconhece e confronta dois resultados do desempenho, como critério para a divisão de tarefas e para a organização das condições de trabalho. O primeiro é o resultado visívelda transformação prescrita nasoperações das tarefase o segundo é a mobilização do trabalhador como indivíduo e como coletivo para administrar sua relação consigo mesmo e com a sociedade e a adaptação às suas tarefas. A consideração desses dois critérios pressupõe que a divisão de tarefas seja uma atividade cooperativa na qual o trabalhador é reconhecido como sujeitoem sua potencialidade de subjetivação. Esse reconhecimento implica em sua potencialidade para participar e opinar no desenho de suas tarefas e do ambiente, como ocorre no modelo de células de manufatura. As tarefas podem e devem ser estudadas e propostas por técnicos porem sem ser implementadas sem discussão individual e coletiva com os trabalhadores que serão seus executores.
Essa participação como sujeito (individual e coletivo) desponta como recurso de sua própria construção a partir da articulação de suas defesas. Através dessa prática o indivíduo pode aprender sobre si mesmo, sobre sua própria articulação psíquica e ser ajudado na identificação das estratégias defensivas coletivas. Sua participação na divisão de tarefas pode promover sua mobilização subjetiva e possibilitar a ressignificação das vivências de sofrimento advindas de seus desempenhos. A constituição de espaços coletivos favorecea ampliação da percepção do trabalhador sobre ele mesmo, condição que o coloca decidindo sobre seu destino ao intervir naquilo que ele e o grupo identificam como requisitos necessários para a construção das tarefas. Assim, neste paradigma o desenho das tarefas aparece como atividade na qual o trabalhador constrói sua emancipação ao aprender a se adaptar e ser auto produtivo, dialogando com o ambiente na demanda das tarefas e com seus ideais, que demandam sua autoprodução.
5 CONCLUINDO: GESTOR BUSCA ADAPTAÇÃO OU EMANCIPAÇÃO DO TRABALHADOR?
Essa exposição dos dois paradigmas desvela os desafios do pesquisador e do gestor diante da diversidade de racionalidades disponíveis para fundamentar sua ação. Sua escolha não é limitada ao fazer da produção econômica, mas se estende ao ser do trabalhador, reconhecendo na divisão das tarefas um de seus principais instrumentos, no qual ele define o fazer da produção e o ser do trabalhador. Como bem expresso por Chanlat (2000), a sociedade é construída através da compreensão do contexto político e sociocultural e de escolhas para o fazer, ambas permeadas por dúvidas e incertezas intrínsecas à condição humana e à complexidade e evolução do mundo. A compreensão que o gestor elabora de sua própria ação alicerça as escolhas, dela decorrentes que se transformam em prática social.
Essa prática pode ser direcionada para a emancipação, ou para a alienação do trabalhador, abafando ou fomentando sua condição de sujeitoauto produtivo, A rotina que operacionaliza esses prática é a divisão das tarefas e a organização do ambiente de trabalho. Essas duas atividades instrumentalizam a construção da sociedade para oferecer qualidade de vida e justiça.Essa prática expõe a gestão do trabalho, cujo sentido, desde sua origem no latim(gerire) comunica a ideia de dirigir, regular (Cunha, 1997). O que é dirigido, regulado? No paradigma da Administração Científica a divisão das tarefas pressupõe a hegemonia da produção econômica na regulagem das operações para seus fins, tomando em conta a capacitação do trabalhador, na qual estão incluídos aspectos de sua saúde que não bastam porque o trabalhador requer seu reconhecimento como sujeito emancipado. No Paradigma da Psicodinâmica a divisão de tarefas pressupõe a regulagem conjunta e interdependente da subjetividade e da produção econômica a qual somente pode ser viabilizada se o próprio trabalhador, reconhecido como sujeito da divisão de tarefas, cuidar de sua subjetividade como condição individual e coletiva. Se a gestão é um processo de regulagem da realidade, necessária à sobrevivência da sociedade, a compreensão daquilo que está sendo, ou será feito e das escolhas do rumo da direção, ou regulagem desponta como requisito fundamental.
A compreensão da ação regulatória do gestor emerge do reconhecimento dos elementos a serem articulados e da reflexão sobre o sentido daquilo que é transformado nessa ação. Esse sentido aparece nos elementos que materializam a regulagem e na forma como estes são articulados. A compreensão dos paradigmas oferece parâmetros para a busca desse sentido. Este não é algo que se encontra pronto nem visível, mas desponta da interlocução entre gestor trabalhador e realidade a partir da qual o gestor faz suas escolhas em busca da produção e da qualidade de vida do trabalhador e da sociedade. Seguramente, faltou essa interlocução aos “inventores” da Administração Científica cuja atenção foi predominantemente focada na eficácia econômica. Seus resultados não carecem de explicação porque foram visíveis durante décadas. Essa carência aconteceu paulatinamente e foi limitada em sua implementação. Na primeira grande revisão desse paradigma, a Teoria das Relações Humanas, seus protagonistas descobriram experimentalmente que o “trabalhador” reage como membro de grupo e não como indivíduo, eles não avançaram na reflexão das consequências dessa descoberta porque estavam mergulhados em contexto histórico de significativa recessão econômica lhes complicando a mudança de rumo na gestão do dia a dia.
Por outro lado, os autores que construíram o paradigma da Psicodinâmica expuseram o sentido da regulagem implicada na gestão com dados claros sobre a condição de sujeito do trabalhador e a subjetividade como variável da qualidade de vida e do próprio sucesso da gestão, ou seja, da eficácia regulatória. Os autores desse paradigma, partindo do sofrimento observado, na interlocução com a realidade, descobriram que o trabalhador é protagonista de seu projeto de vida e pode aprender a enfrentar seu próprio sofrimento e construir sua emancipação.
Dados recentes sobre o suicídio de trabalhadores têm sensibilizado a opinião pública sem gerar as mudanças significativas esperadas na superação de suas causas, assim como dados sobre os impactos de profissões estressantes como pilotar aviões comerciais não geraram alterações significativas na regulagem exercida sobre esses profissionais. Tal como aconteceu com os resultados dos experimentos realizados pelos autores da Teorias de Relações Humanas, os dados sobre o estresse dos pilotos, de motoristas de caminhão e os suicídios de executivos são claros, mas oferecem apenas informação e não força política para alterar a legislação, a cultura e a racionalidade da gestão. Os paradigmas são fontes de reflexão ajudam na compreensão da realidade, fomentando a busca de sentido das escolhas. O sentido, embora fator fundamental, não é suficiente para promover alterações nos rumos da regulagem gestionária da divisão de tarefas que está engolfada em um contexto institucional.
Para se compreender a atuação de um gestor, de suas escolhas e de sua articulação dos recursos, a Psicologia tem oferecido teorias e dados empíricos de seu diálogo com a realidade. A POT tem enriquecido a compreensão da divisão de tarefas explicando a cultura da organização, o modelo de gestão adotado, as metas e objetivos perseguidos pela organização, as práticas adotadas para a execução, acompanhamento, avaliação e ajustes das atividades, além das relações de poder presentes na interação entre os trabalhadores em seus distintos papeis, em todos os níveis hierárquicos da organização. Esse enriquecimento revela a POT como um parceiro com quem a divisão de tarefas pode explorar sua fonte de interlocução com a realidade. O mundo da gestão do trabalho requer continua aprendizagem que pode ser fomentada pela observação, pela interlocução e pela reflexão. A eficácia da gestão requer compreensão de seu objeto de ação e a captura de elementos que possam diferenciar as contingências limitadoras das emancipadoras. Essa diferenciação é hoje, mais complicada pela diversidade de paradigmas e pela exponencial implementação de novas tecnologias que impõem condições, como o individualismo, a organização do trabalho e a divisão de tarefas. Essa complicação leva a gestão a se conscientizar da importância da busca de parceiros como a POT para entender a consistência de suas escolhas.
A atividade dos gestores, vista a partir do paradigma funcionalista pode ser compreendida como sendo um conjunto de técnicas para racionalizar e aperfeiçoar o funcionamento da organização. Nele, os gestores são os responsáveis por fazer com que as ações aconteçam como o conhecimento científico as explica. A divisão de tarefas emerge como atividade balizada pela racionalidade técnico-econômica. É difícil pensar nessa racionalidade como ação emancipatória uma vez que o sujeito não participa da divisão das tarefas, mas deve se submeter à explicação científica que a sustenta.
Diferentemente, nas atividades dos gestores na perspectiva do paradigma da Psicodinâmica do Trabalho, a divisão de tarefas emerge como ação articulada para a otimização conjunta e simultânea das demandas de natureza técnica e produtiva e das demandas advindas do sujeito que pensa, escolhe, sente, sofre e busca emancipação para dar rumo ao seu projeto de vida. Neste caso, sua função é promovera interlocução entre a demanda de resultados e as demandas do sujeito, na qual o trabalhador é um protagonista. É mais fácil considerar a emancipação como um resultado possível e consistente com a divisão de tarefas. Brian Baxter (1982) analisa essa consideração colocando como critério o trabalho auto produtivo, ou seja, o trabalho no qual o trabalhador constrói transformações no mundo e em si mesmo, como sujeito de sua história.
Promovendo esse diálogo, o gestor descobre que a compreensão e as escolhas podem variar por força das contingências econômicas, tecnológicas e políticas., sendo que estas aparecem nos resultados da articulação das tarefas e da organização do ambiente. Portanto, a divisão de tarefas é o espaço no qual se manifestam as causas imediatas da eficácia e da adaptação humana com seus impactos na emancipação do trabalhador. Esse espaço foi descoberto duas décadas antes da elaboração da Psicodinâmica do Trabalho, nas teorias que buscavam a qualidade de vida no trabalho (Cherns e Davies, 1975).
O ponto crucial de alguns projetos nos quais essa teoria foi testada foi a divisão de tarefas, por esse poder catalizador que esta atividade tem de articular as demandas de adaptação. O prenúncio de alterações significativas na institucionalização do trabalho sob os determinismos da digitalização e dos contratos de trabalho autônomo e a consideração de apenas dois paradigmas abrem uma pauta rica para a agenda da POT em seu desafio de diferenciar adaptação e emancipação na organização do trabalho.
Argyris, C. (1957). Personality and Organization. New York: Harper.
Publicado na Revista Brazilian Journal of Development., v.6.
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