Profa. Dra. Kátia Barbosa Macêdo e Carolina Martins dos Santos
Resumo: esta pesquisa teve por objetivo analisar as estratégias individuais e coletivas de mediação do sofrimento psíquico utilizados na busca da saúde psíquica contemplando a subjetividade no trabalho como resultante da interação entre sujeito e dimensões do contexto laboral informatizado. O estudo possui caráter descritivo e exploratório. A metodologia utilizada fundamenta-se na clínica psicodinâmica do trabalho, realizada com uma categoria específica, no caso, a dos gestores do SENAI-GO. Para coleta e analise dos dados utilizaram-se as técnicas: análise documental, entrevistas individuais e espaço de discussão coletiva. Os resultados apontaram sobrecarga de trabalho demandado pela nova organização de trabalho onde a tecnologia é inserida e questionamentos quanto à normatização e ao discurso ser diferente da prática. As estratégias defensivas utilizadas pelo grupo não contribuem para a cooperação e o relacionamento entre os pares, gerando o esvaziamento dos coletivos.
Palavras-chave: Psicodinâmica. Clínica do trabalho. Tecnologia. Informatização
A partir de meados do Século XX, grandes avanços tecnológicos vêm repercutindo intensamente na produção econômica e no trabalho no mundo todo. De acordo com Singer (1998) essas transformações que levaram a Terceira Revolução Industrial se traduzem no impacto das Novas tecnologias, como o Microcomputador, a Microeletrônica, a Robótica, a Engenharia Genética, a Telemática – uso combinado de computadores e meios de telecomunicações, como fax, celular, internet, televisão -, entre outras.
De acordo com Macêdo (2010), tem ocorrido um aumento significativo no interesse no campo de estudos relacionados ao mundo trabalho nos mais diversos segmentos. A compreensão do papel da tecnologia na vida do sujeito trabalhador remete, pois, a uma relação de interdependência entre sociedade, tecnologia, cultura e trabalho e processo saúde-doença (CECÍLIO, 1998). Nesse sentido, a renovação tecnológica trabalho e satisfação e saúde do
trabalhador se estabelecem como uma forma de subjetivação que incide na proporção da autonomia e do domínio que o sujeito consegue imprimir ao seu trabalho, bem como ao grau de realização que daí decorre para a sua realização profissional.
Rifikin (2004) fez uma análise enfatizando a influência da tecnologia na forma
como as pessoas realizam suas tarefas, despontando que, houve uma transformação em alguns aspectos operacionais, antes mais brutalizados, para os atuais, mais calcados em máquinas e equipamentos que podem ser operados em ambientes mais limpos e menos conturbados.
Os estudos de Rebecchi apontaram que trabalhador pode sentir-se impotente e ansioso por não ser aquele que tem a iniciativa e o controle da atividade e, mais do que isso, para o usuário o computador é uma máquina inteligente e tem suas razões para assim proceder. Rebecchi (1990, p. 22) considera que:
[…] há uma transferência da inteligência do homem para a máquina e uma nova dependência, pelo homem, dessa inteligência que ele mesmo depositou na máquina, no computador, no cérebro artificial, como se diz normalmente na linguagem comum.
O objetivo geral deste artigo foi investigar as vivências subjetivas de um grupo de gestores do SENAI/GO em relação à informatização de processos da Instituição sob as lentes da abordagem Clínica Psicodinâmica do Trabalho.
Julgou-se importante fazer um estudo de como passou a ser o cotidiano dos trabalhadores do SENAI, após a implantação de sistemas informatizados, este presente no estado de Goiás desde 1952, tendo passado por diversas mudanças. Compreender a realidade mencionada mostra-se relevante para os empregados, uma vez que, conforme Koopmans et al (2013), embora a taxa de recorrência dos distúrbios mentais seja alta, os afastamentos devido
aos transtornos mentais comuns, ainda não foram estudados.
Macêdo (2015) afirma que nos últimos dez anos, as práticas clínicas tiveram um crescimento significativo no cenário brasileiro. Empresas públicas, privadas, Centros de Referência de Saúde ao Trabalhador, Centros de Atenção Psicossocial, universidades, cooperativas, sindicatos, instituições sociais e hospitais públicos tem realizado a prática clínica do trabalho. Esse tema é importante e atual, pois as pesquisas realizadas no âmbito da saúde mental do trabalhador, especificamente usuários de TI, têm ocorrido de forma relevante. No estado de Goiás, não foram realizados estudos, identificados até o momento. Essa temática é original.
A psicodinâmica do trabalho considera o trabalho como eixo central de estruturação do sujeito e prioriza, em sua análise, a organização do trabalho para compreender como são produzidos os processos de subjetivação e de saúde e as patologias (DEJOURS, 2007). A centralidade do trabalho se refere à capacidade do sujeito de manter a saúde por intermédio do trabalho, ou seja, pela reapropriação do poder de transformar a organização do trabalho e reconquistar as condições favoráveis a construção da saúde (DEJOURS, 2007).
Dejours (2007) defende a ideia de que as condições de possibilidade do reconhecimento da cooperação e do desenvolvimento da inteligência no trabalho dependem da organização do trabalho. Sendo esta a forma como as tarefas são definidas divididas e distribuídas entre os trabalhadores como também a forma como são concebidas as prescrições e a forma como se opera a fiscalização, controle, ordem, a direção e a hierarquia.
Os sistemas de computadores são utilizados em muitas atividades, das mais simples às mais complexas. O sucesso de um sistema é determinado pelos seres humanos que o usam e, portanto é profundamente afetado pela sua facilidade de uso, pela sua capacidade de desfazer ações indesejadas e de auxiliar a minimizar erros – que correspondem a alguns dos critérios de
usabilidade que torna o sistema agradável e eficiente – na perspectiva dos seus usuários.
MÉTODO
A pesquisa empírica foi realizada por meio de um estudo de caso, de caráter descritivo, com empregados do SENAI-GO lotadas na cidade de Goiânia e interior conforme escolha aleatória dos trabalhadores, a fim de verificar os questionamentos levantados quanto aos impactos da informatização na organização do trabalho.
Essa população foi escolhida devido ao fato da Instituição estar presente no estado de Goiás desde 1960 tendo passado por diversas mudanças como também tem como foco de trabalho o desenvolvimento de tecnologias, há empregados que estão na Instituição desde que se iniciou desta forma possuem uma visão da estrutura da empresa, podendo assim informar
com melhor precisão as características dos processos de mudança organizacional na Instituição, bem como expor alguns dos seus conceitos pessoais sobre o assunto em questão.
A metodologia utilizada fundamenta-se na clinica psicodinâmica do trabalho, a qual, com base na teoria psicanalítica e nas ciências sociais, procura desvelar e compreender as vivências intra e intersubjetivas de uma categoria específica sobre a organização do trabalho, no caso, a dos gestores do SENAI/GO. Assim, em 1992, Dejours apresenta uma metodologia para psicodinâmica do trabalho em que a criação de espaços de discussão coletivos é o caminho para identificação das estratégias defensivas coletivas. Para o autor a analise da organização do trabalho, das relações do trabalho e das condições do trabalho, pode promover a mobilização subjetiva e possibilitar a ressignificação das vivencias de sofrimento advindas dessas categorias.
Compareceram as sessões estabelecidas quinzenalmente, totalizando cinco participantes dos encontros coletivos para discussão dos dados analisados. Do total dos participantes, 04 eram do sexo masculino e 01, do feminino.
A discussão das vivências de prazer-sofrimento provenientes da dinâmica das situações de trabalho foi construída ao longo de três sessões por duas pesquisadoras. Concretizaram-se em 2015, com duração média de duas horas, apresentando o objetivo de instaurar a clínica psicodinâmica do trabalho.
A análise e as interpretações das situações de trabalho dadas pelas pesquisadoras e trabalhadores asseguraram a validade do material coletado à medida que participaram um grupo de pesquisadores que confrontam permanentemente o conteúdo das sessões entre si e com o próprio grupo de trabalhadores no momento da realização da pesquisa.
A obtenção do consentimento dos participantes, com a garantia da preservação da privacidade e uso dos seus dados especificamente para esta pesquisa através termo de consentimento livre e esclarecido submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, estando o participante livre para recusar-se a participar, retirar seu consentimento ou interromper a participação a qualquer momento.
RESULTADOS
Os dados expostos nas entrevistas individuais demandou maior número de questões relacionadas ao sofrimento no trabalho quanto à informatização de processos. As análises apontam falhas na organização do trabalho quanto ao treinamento para operar os sistemas informatizados da Instituição. Embora a organização conceda bolsas de estudo, incentivos e apoios nessa área, deixa a desejar quanto a treinamentos específicos para que o trabalhador que inicia na instituição exerça suas funções, visto que seu treinamento de integração abrange apenas regras de convivência e políticas de recursos humanos.
Quanto aos temas levantados durante o espaço de discussão coletivo com os gestores, foram desenvolvidos com base nas categorias descritas no método proposto para este trabalho, organização do trabalho e mobilização subjetiva, como também da categoria emergida da demanda emanada – conforme dados analisados nas entrevistas –, a informatização.
Os resultados apontaram, que os entrevistados, trabalhadores na Instituição há maisde 15 anos, expressaram claramente como no decorrer dos últimos dez anos o contato com o outro diminuiu, interferindo nas relações ou até mesmo substituindo relações humanas por relações homem-maquina. O computador passou a ser o melhor amigo e de acordo com os entrevistados conversar com ele é melhor do que conversar sozinho.
No entanto, outras ferramentas, além do computador advindo deste novo mundo tecnológico nos leva a uma corporificação, como o celular que parece ter se tornado um membro a mais do homem, muitas vezes sendo referido pelos trabalhadores pesquisados como braço direito, sendo possível abster-se de outras tecnologias, mas o celular sempre se está em contato, como enfatiza um participante da pesquisa. Percebeu-se que cada vez mais as ordens chegam por tecnologias, não há voz, não há gesto, não há expressão do corpo, tornando-se algo sem afetividade.
A informatização contribui para individualização/nas novas gerações a individualização predominante e mudanças na forma de relacionar, conforme evidenciado no trecho
abaixo:
3: […] essa conversa via e-mail, o exemplo que eu dei do grupo aqui do analista superior, não tem, o pessoal mais jovem não tem problema, não teve um dois três que é mais aguçado, não entendi aquele grupo, como é aqui como é, não vou explica aqui, então é porque, porque faz parte da rotina, da vida desses meninos mais jovens essa questão, meu filho, por exemplo, ele nunca eu nunca vi meu filho ligar pra namorada dele […] só no whatsapp, ele sabe tudo que ela está fazendo o dia inteiro, ela sabe tudo que ele está fazendo o dia inteiro só no whatsapp, não tem uma ligação pra ela […].
As tecnologias foram criadas para melhorar, agilizar, simplificar e substituir o trabalho braçal, no entanto, percebe-se que diante essa nova realidade que se é apresentada, ocorre uma aceleração e sobrecarga de trabalho tais fatores é evidenciado no trecho abaixo:
S3 […] na verdade o que esta acontecendo é o contrário, a gente esta tendo muito mais ocupação até porque como agente deixou de fazer esse trabalho braçal e S2 sabe muito bem disso né S2? Porque na sua área você sem tecnologia […] porque assim […] imagina você fazer lançamento de diária de não sei o que lá […] o tanto de coisa que você faz […].
S2: Eu vejo que velocidade da informação é enorme e o tempo nosso de trabalho é pouco da exigência que é feito e a rapidez que a gente é […] a gente acha que isso é na verdade […] a gente tornou-se escravo dessa tecnologia […] eu acho que o ponto ruim é esse […].
S3: […] a tecnologia por mais que elas nos sulgue […] que nem você diz nos tornando escravos […] nos demanda muito mais, sem ela seria […] praticamente impossível de trabalhar hoje […]
Destaca-se entre os participantes sentidos positivos e negativos quanto a informatização dos processos organizacionais, que podem gerar vivencias de prazer e sofrimento no trabalho:
S4: […] Eu vejo que velocidade da informação é enorme e o tempo nosso de trabalho é pouco pela exigência que é feito e na rapidez que é solicitado e que a gente acha […] a gente tornou-se escravo dessa tecnologia […] eu acho que o ponto ruim é esse […] a gente ficou meio escravo da tecnologia […].
S5: […] a gente que viveu na década de 80, 90 a gente viu muito o avanço da tecnologia nos anos 2000 foi uma loucura aqui no Brasil né […] então isso é muito […], mas agora você olha para trás assim e como assim? Como que era o mundo sem internet […] e como é que era o mundo sem computador?
Quanto a dificuldade das pessoas se adaptarem as constates mudanças decorrentes da informatização dos processos organizacionais, demonstram resistência, prorrogando o uso da ferramenta levando a sobrecarga de trabalho conforme expresso:
S3: […] esse é um amuleto joia que usam aqui: não, olha é muito burocrático, é muito clique que eu tenho que dar, eu prefiro atender meu cliente, faze a proposta boca a boca para ele e já tem que começa a, não meu filho você não faz assim mais não porque aqui é uma empresa, tem 3000 funcionários trabalhando aqui, então se você fez a proposta aqui, você tem que ir lá digitar a proposta o que você acertou o quanto vai custar, tem que ter isso, tem que fazer a compra no encontro […] só que as pessoas, a cultura é difícil mudar, demora mais que a tecnologia então […]
No que se refere à organização do trabalho, os depoimentos dos participantes indicam que as condições de trabalho tornaram-se muito intensas. Vivência de sofrimento por sobrecarga de trabalho e pressão por resultados também são evidenciados pelo enxugamento do numero de funcionários e aumento das metas e demandas da empresa como visto do discurso do participante S1: “[…] uma coisa é eu ter 200 funcionários para 5.000 matriculas e outra coisa é ter 150 funcionários para 15.000,00 matriculas […] muita diferença em termos de ritmo […]”. Além do ritmo acelerado da organização percebe-se também dificuldade em pessoas que possam se confiar conforme evidenciado nos trechos abaixo:
S1: […] agente começou a área da saúde, agente integrou com o SENAI […] o SENAI noprimeiro ano tinha 300 matrículas […].
S3: […] kkkkk agora tem 3 mil matriculas […]
S1: […] 15 mil matrículas […] pagamento é 15 eu estou com 12 juntando com então a progressão foi uma loucura […] eu tinha a minha fase quase inteira de SESI 15 anos de SESI tinha 30 funcionários então agente estava com 200 agora está com 150 e isso está é um ritmo muito maluco porque a presença é fundamental, e agente não tem como fazer […] e isso é uma coisa que a gente tem uma dificuldade muito grande, é de conseguir, assim, ter uma estrutura que você tem pessoas que você confia, pessoas que responde por você e pra diminuir a sobrecarga que tem e agente ter essa capacidade também de soltar porque as questões hoje nós temos questões legais com relação a áreas da saúde então qualquer problema que tiver é uma questão séria a empresa vai ter um problema serio de um laudo nosso errado e eles cobram muito mais […].
Os entrevistados revelaram sobrecarga de trabalho demandado pela nova organização de trabalho onde a tecnologia é inserida e questionamentos quanto à normatização e ao discurso ser diferente da prática. No mundo do trabalho atual presencia-se o esvaziamento das condições para reunião do coletivo de trabalho porque tudo passou a ser feito pelo computador. O trabalhador tem que se informar sozinho, a sua interface é com a máquina, e sem condições sociais torna-se difícil a construção do coletivo de trabalho. As estratégias defensivas utilizadas pelo grupo não contribuem para a cooperação e o relacionamento entre os pares, gerando o esvaziamento dos coletivos.
As novas formas de gestão oferecem um relativo espaço de liberdade, mas subtraem a expressão de afetos, produzindo a exclusão da autenticidade pessoal, sendo este um dos motivos para a restrição do prazer no trabalho. Périlleux (1996) aponta para o fato de as novas estruturas de organização do trabalho tornar o processo de socialização problemático, porque modifica as condições de compreensão de sentimentos relativos ao trabalho.
DISCUSSÃO
A informatização de processos apresenta-se de forma ambígua, gerando ora vivências de sofrimento hora vivências de sofrimento, como será discutido mais adiante; no entanto, percebe-se que a tecnologia tornou-se indispensável as atribuições dos gestores, como foi relatado: “[…] eu sempre vejo melhoras e eu fico pensando, cara como é que agente fazia isso antes?” Diante disso, questiona-se como realizavam o trabalho antes de ser informatizado, visto que o mesmo facilita o desenvolvimento dos processos organizacionais.
Ao investigar os sentidos atribuídos às novas tecnologias no trabalho dentro de uma perspectiva socioconstrucionista, Tonelli (2000), analisou sentidos ambíguos que os trabalhadores concediam aos computadores utilizados no seu cotidiano de trabalho. Os sentidos produzidos por esses sujeitos foram agrupados em três grandes categorias: as máquinas corporificadas (com se fizessem parte do corpo humano), as máquinas encantadas (um objeto quase
mágico, recoberto de afeto) e as máquinas vistas como instrumentais (parte indispensável do trabalho, sem as quais esse não seria possível). As tecnologias que foram nomeadas pela autora como corporificadas, tendo como exemplo o computador e o relógio, seriam descritas como
uma extensão do corpo dos sujeitos. Percebe-se que com isso, foram modificações significativas na concepção subjetiva do sujeito.
Zanelli (2016) ressalta que se questiona na atualidade o rompimento de padrões decorrente de um cenário de competição cada dia mais aguda. Os princípios tayloristas e fordistas são questionados, embora subsidiem ainda muitos procedimentos. Sobre eles se desenvolveram novos conceitos e procedimentos: produção enxuta, qualidade total, automação, flexibilidade, descentralização produtiva e outros. Tal reestruturação tende a redesenhar contornos na organização e gestão do trabalho. Sob o nome de reestruturação produtiva, inovações tecnológicas, organizacionais e de gestão almejam processos de trabalho integrados e flexíveis.
Vivência de sofrimento por sobrecarga de trabalho e pressão por resultados também são evidenciados pelo enxugamento do numero de funcionários e aumento das metas e demandas da empresa como visto do discurso do participante S1: “[…] uma coisa é eu ter 200 funcionários para 5.000 matriculas e outra coisa é ter 150 funcionários para 15.000,00 matriculas […] muita diferença em termos de ritmo […]”.
Em 2015, a despeito da forte crise econômica, o número de matrículas em cursos realizados pelas unidades do SENAI no Estado registrou crescimento médio de 4% em relação a 2014.
Percebeu-se que os espaços de discussão coletivos, realizado conforme sugerido por Dejours (1992) proporcionaram aos participantes desta pesquisa vivencias de prazer como pode ser observado no trecho abaixo:
S2: […] nossa quando agente diverte nem vê o tempo passa […]. S3: […] ah eu também nem vi o tempo, quando olhei pra hora falei nossa […]
A aplicação das estratégias de mobilização coletiva implica na redução ou eliminação do sofrimento e mudança da situação de trabalho onde o grupo compartilha o sofrimento e encontra conjuntamente soluções para lidar com as situações desmotivadoras.
A mobilização coletiva busca promover o predomínio de vivências de prazer por meio da criação de um espaço público de discussão, construído baseado na cooperação e na confiança mútuas dos trabalhadores no ambiente de trabalho. Dessa forma, o contexto influencia as estratégias a ser adotadas e que vão prevalecer entre os trabalhadores. (MESQUITA et al., 2016)
Dejours, Abdoucheli e Jayet (1994), constataram que a constituição de espaços coletivos possibilita ampliar a percepção do trabalhador sobre ele mesmo, favorecendo o seu processo de emancipação e a consequente intervenção naquilo eu o grupo identifica como necessário para melhorar a organização do trabalho. Espaço de discussão a construção de um espaço de fala e escuta em que podem ser expressas opiniões contraditórias ou baseada em crenças, valores, e posicionamento ideológico dos participantes do espaço (DEJOURS, 2008).
A substituição de diversos sistemas por um único que integra todas as áreas é um desafio para as empresas que necessitaram de grandes investimentos e de uma equipe de profissionais robusta, pois as tarefas reestruturadas exigiram mudanças nas atividades diárias e consequentemente nos hábitos das pessoas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho do gestor do SENAI-GO tem sido marcado por um significativo processo de intensificação e exigências nos últimos cinco anos. Esse contexto adverso é reflexo de mudanças no mundo do trabalho com a introdução de novas tecnologias e da informatização de processos que atingiu o sistema indústria, expostos a um movimento de reconfiguração.
A informatização dos processos, ao mesmo tempo em que facilita a função do gestor, também gera sobrecarga de trabalho, invadindo a vida privada do indivíduo e fazendo com que ele se veja na obrigação de estar o tempo todo à disposição da Instituição, visto que mesmo fora de expediente está resolvendo questões relacionadas a sua função. Esse aspecto delineia um modo de viver do gestor em que ele não reconhece os limites entre tempo de
trabalho e não trabalho.
A psicodinâmica do trabalho visa abordar o trabalho enquanto atividade humana buscando interpretar clinicamente suas causas, fracassos e as vitórias. Reconhece o que implica para o trabalho, o fato de ser um trabalho vivo, não se limitando aos efeitos nocivos do trabalho sobre a saúde, mas também, às situações nas quais a relação com o trabalho é favorável à saúde. Busca compreender porque e como o mesmo trabalho, em função de sua
organização, pode inscrever-se em uma dinâmica de destruição ou de construção da saúde (DEJOURS, 2007).
Desta forma, a clínica psicodinâmica do trabalho pode contribuir para o estudo dos processos de informatização na estrutura organizacional a partir da identificação das vivências subjetivas dos trabalhadores, compreender e propor ações de melhoria para estes em suas organizações e ainda analisar os reais interesses dos que ali se propõe a desenvolver seu trabalho. Sugere-se para estudos futuros que a informatização nas organizações sejam analisados a partir desta mesma perspectiva da psicodinâmica do trabalho.
Referências
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DEJOURS, Christophe. A loucura do trabalho: estudo da psicopatologia do trabalho. São Paulo: Cortez, 1992.
DEJOURS, Christophe. A psicodinâmica do trabalho na pós-modernidade. In: MENDES, Ana Magnólia; LIMA, S. C. C.; FACAS, Emílio Peres (Orgs.). Diálogos em Psicodinâmica do Trabalho. Brasília: Paralelo 15, 2007. p. 13-26.
DEJOURS, Christophe. Avaliação do trabalho submetida à prova do real – Crítica aos fundamentos da avaliação. In: SZNELWAR, Laerte Idal; MASCIA, Fausto Leopoldo. Trabalho, tecnologia e organização. São Paulo: Editora Blucher, 2008.
DEJOURS, Christophe; ABDOUCHELI, Elisabeth.; JAYET, C. Psicodinâmica do trabalho: contribuições da escola dejouriana à análise da relação prazer sofrimento e trabalho. São Paulo: Ed. Atlas, 1994.
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MACÊDO, Kátia Barbosa. O trabalho de quem faz arte e diverte os outros. Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2010.
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MESQUITA, Simone Maria Moreira. et al. Ergonomia, Psicodinâmica e riscos. ECOS, v. 6, n. 1, Rio de Janeiro, 2016.
PERILLEUX, Thomas. Entre le spectacle de la souffrance et l’engagement dans l’action. Revue Internationale de Psychosociologie, v. 3, n. 5, p. 127-139, França, 1996.
REBECCHI, Emílio. O sujeito frente à inovação tecnológica. Petrópolis: Vozes/Ibase, 1990.
RIFIKIN, Jeremy. O fim dos empregos. São Paulo: MBooks, 2004.
SINGER, Paul. Globalização e desemprego: diagnóstico e alternativas. São Paulo: Contexto, 1998.
TONELLI, Maria José. Os sentidos das máquinas: novas tecnologias e a aceleração no cotidiano do trabalho. 2000. Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2000.
ZANELLI, José Carlos. Sobre os temas transdisciplinares em saúde mental e trabalho. In: MACÊDO, K. B. et al. (Org.). Organização do trabalho e adoecimento – uma visão interdisciplinar. Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2016
O processo de informatização organizacional e a contribuição da clinica psicodinâmica do trabalho para sua implantação. Escrito por Carolina Martins dos Santos e Katia Barbosa Macêdo. Publicado na Revista Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 18a Região. , v.2, p.364 – 375, 2015.
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